Há 20 anos, no dia 4 de junho, uma série de protestos de estudantes chineses resultou em violenta repressão na Praça Tianenmen, na China. E dias depois este protesto (ou massacre) gerou a letra de uma das músicas mais importantes da carreira do Marillion.
Em 1989, o clima de insatisfação do povo chinês chegou a seu ponto máximo. O sistema vigente era formado por corruptos, e a desigualdade e repressão do regime levaram a uma união impensada entre setores de classes sociais e formações diferentes. O grupo de chineses, represenntados majoritariamente por estudantes e trabalhadores, tomaram as ruas de Pequim para realizar uma série de protestos pacíficos, constituídos basicamente de marchas pela cidade.
Também em 1989, o clima era de mudanças para o Marillion. Com a separação do Fish, o vocalista e cartão de visitas da banda, havia uma incerteza no ar. Steve Hogarth, munido de um balde vermelho cheio de fitas de suas ex-bandas (Europeans e How We Live), se apresentou para ocupar a posição e a banda foi à luta, com o peso da necessidade de se reinventar.
Os protestos em Pequim ganharam características mais sombrias quando o governo chinês decidiu reagir com rigor contra os protestos. O exército foi às ruas na noite de 3 de junho e o clima de terror se instalou. O período negro dos protestos se iniciava.
No Marillion, a repressão vinha de um grande grupo de pessoas – de fãs è mídia – que já haviam dado a banda como morta, e reagiram mal a um novo vocalista, de background e personalidade tão distantes do antigo. O período negro da transição da banda se iniciava.
O amanhecer do dia 4 de junho foi devastador. Tanques e infantaria do exército chinês começaram a dissolver o protesto com violência, com uma estimativa entre 400 e 7000 (!) mortos em um único dia. O dia 5 de junho ficou marcado por uma imortal imagem feita pelo fotógrafo americano Jeff Widerner, com um solitário protestante desasfiando uma fila de tanques (imagem que ilustra o topo desta mensagem). Era a representação de que a coragem e a dedicação ao que se acredita sempre vão superar a força.
Em 1989, o Marillion lançou o álbum Seasons End, que mostrou uma banda madura, segura de si e com composições que se tornariam clássicos imortais da banda (como “Easter”). O disco foi muito bem recebido por crítica e fãs, além de mostrar a todos que não acreditavam o enorme talento daquele novo vocalista. O álbum marca a renovação da importância da banda e sua força. Era a representação de que a coragem e a dedicação ao que se aredita sempre vão superar a desconfiança alheia.
As duas histórias se unem de maneira avassaladora em “The King Of Sunset Town”, com letra originalmente escrita por John Helmer, que falava de moradores de rua em Londres.
Porém, o clima dos protestos e do massacre sentido durante as gravações do disco levou Steve Hogarth a reescrevê-la e trazê-la para o tema. O título se refere a uma pessoa que crê ser rei, mas que está presa a convicções antiquadas, retrógradas, em uma referência a Deng Xiaoping, principal dirigente da República Popular da China entre 1976 e 1997.
Apesar de tratar do tema em todos seus versos, a letra faz três referências explícitas aos acontecimentos do começo de junho de 1989:
“An avenue of eternal peace…”
Referência à Praça da Paz Celestial (que na verdade é traduzido como “celestial peace”, mas tem em “eternal” um sinônimo aceitável)
“…on the 4th of june…”
Referência à data do massacre.
“…before the 27th came…”
O 27º Batalhão do exército chinês foi responsável pela maior parte do massacre do 4 de junho. Era responsável pelos tanques que passavam por cima dos protestantes.
O mais incrível da música é ela falar de mudanças tão profundas na história do mundo, ao mesmo temmpo em que ela é um símbolo de mudanças profundas na história da banda. É impossivel não pensar como o clima do planeta inteiro, acompanhando os protestos pela TV, não tenha influenciado a banda em mais de um nível.
Com “The King Of Sunset Town”, o Marillion abandonou os temas espirituais do Fish e embarcou em letras mais humanas, mais realistas. Não à toa, o mesmo disco conta com “Easter”, um tratado sobre a violência dos confrontos entre irlandeses e ingleses.
1989 mudou o mundo e mudou a banda.
A letra inteira pode ser lida neste link .
Mais uma vez, eu não seria nada sem o Explanation Of Song Elements, do Fraser Marshall, para completar as lacunas das histórias por trás das letras da banda.
Vale conhecer a história do massacre a fundo, tanto na Wikipedia quanto nos arquivos do New York Times . Este link leva a todos os artigos do jornal desde o dia 20 de maio (quando a lei marcial foi decretada) até o dia 6 (término do massacre).
Belo post Rodrigo!
Lembro-me muito bem. Foi um dia triste para a democracia.
Saudações!
fantastico post!!!! so faltou a tradução completa da musica!!!
parabens pelo blog!!!
Excelente post. Sempre recomendo teu blog a quem queira conhecer um pouco mais da banda.
Abraço.
Cara, eu já recebi vários elogios, mas o seu foi o melhor. O grande objetivo disso é trazer gente nova para a banda. Quando leio comentário assim eu tenho certeza de que tou acertando. Forte abraço.
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